O dia em que a caneta deixou de escrever
sexta-feira, 16 de agosto de 2013
terça-feira, 16 de julho de 2013
Grito
Sinto um grito arrepiante. Não o ouço, sinto-o. Não sei de onde vem, mas associo-o a ti. Tem o teu timbre, o teu sabor, o teu cheiro.
Há muito que deixei de te ouvir, felizmente. De te ouvir, de te cheirar, de te ver. Há muito que deixei de pensar em ti, que te soltei de mim, que te deixei ir. Há muito que deixaste parte do meu ser mas nunca deixei de te sentir.
Nunca encontrei uma explicação lógica, mas ainda te sinto.
E pior do que te sentir é saber que te sinto. É saber que nunca saíste definitivamente de dentro de mim. É saber que, independentemente do que faça para o evitar, nunca deixei de pensar em ti.
É viver vulnerável a qualquer gesto teu. Na ânsia e no medo de te deixar de sentir.
De viver nesta aparente contradição.
É viver assim.
E gostar.
Pausa
Depois de uma caminhada suada de vida, paro e deito-me. Deito-me e paro. E, parada, observo.
Depois de tanto olhar para o chão, olho finalmente para o céu. E vejo o que sempre esteve ali mas que nunca parei para ver. Vejo o que procuro e que sempre fugiu de mim.
Mas desta vez vejo-o, e sinto que sempre o vi.
domingo, 14 de julho de 2013
Brindemos!
Ao tempo!
Ao tempo que esperamos. Ao tempo que nos envelhece. Ao tempo que vivemos.
Ao tempo que gastamos. Ao tempo que aproveitamos. Ao tempo que desperdiçamos.
Brindemos ao tempo porque o tempo tem asas. Porque a forma como o usamos define quem somos. Porque o tempo pode transformar um "eu" e um "tu" num "nós". Brindemos ao tempo.
Aos tempos difíceis, aos tempos fáceis, brindemos ao tempo.
Esqueçamos o "eu", o "tu", o "nós". Esqueçamos o céu e a terra. Esqueçamos tudo e brindemos.
Ao tempo! Porque quando perdemos tudo, resta-nos tempo.
segunda-feira, 8 de julho de 2013
Bússola
E rompo com o padrão do comum.
Destruo o relógio
E deixo de cronometrar a vida.
Sou alquimista da dor
E fujo à verdade,
As regras da civilização
Nunca definiram quem sou.
Perco-me em casa,
Deixo escapar o meu Norte.
Não sei como me chamo,
Mas espero descobrir.
terça-feira, 2 de julho de 2013
Piano
Tocar piano é uma aventura, e o avanço é uma jornada.
Começamos a tocar para uma cadeira, depois para a família. Para os amigos, para desconhecidos, para um público. E depois de tanto ouvir, a cadeira manifesta-se. Os parafusos saem do lugar e finalmente aplaudem. As pessoas levantam-se. Os sentimentos acalmam-se. E só depois de toda a euforia, só depois da aprovação geral, é que tocamos para nós. Ouvimos o que tocamos há anos e finalmente o entendemos. Damos outro sentido à música, damos outro sentido a nós.
Ouvi-me no domingo, espero que um dia também te ouças.
terça-feira, 25 de junho de 2013
Retrato
Olho-te. E enquanto olho para ti observo-te. E enquanto te observo contemplo-te. Memorizo-te. Decoro-te.
Começo a pintar-te no papel numa ingénua tentativa de perpetuar a tua memória em mim. Como se conhecesse o futuro, como se previsse o passado. Mas infelizmente não o consigo prever. O mundo está tão trocado que o que já vivi não passa de uma mera suposição. E o futuro de uma mera fantasia.
Abdicamos tempo dos outros para nos conhecermos a nós próprios. Deixamos o mundo de parte para elevarmos os nossos egos penosamente rebaixados.
E finalmente apaixonamo-nos. Mesmo quando deixamos de procurar. Mesmo quando prometemos desistir.
E de repente o nosso mundo volta a rodar para o lado certo.
Despacho-me e pinto um retrato teu. O fim pode chegar, desta vez já estou preparada.

